10 abril 2009

Chiado (1)

É lá que eu me vejo quando, ao fim de uns meses, a distância começa a pesar um pouco. Tem sido cenário familiar de quase toda a minha vida. Comecei por passear por lá sábado à tarde, durante a minha curta adolescência. Era nessa época composto essencialmente por três ruas e terminava no largo com o seu nome. Fazia parte de um território mais vasto que dava pelo nome de Baixa. Ir à Baixa nas tardes de sábado era nesses tempos um dos programas favoritos para o qual qualquer pretexto servia. Podia ser simplesmente comprar uns botões na Rua dos Retroseiros. Lá íamos de metro até aos Restauradores, estação terminal. Despachado o pretexto, subíamos a Rua do Carmo, na época bem mais animada do que actualmente. Na Rua Garrett imperava a Livraria Bertrand onde eu devorava com os olhos os livros expostos nas bancadas e de vez em quando comprava um Livre de Poche, relíquia adequada ao meu bolso. Era o ambiente que importava, local de escritores com cheiro próprio de grande livraria e um certo silêncio de igreja. A figura de Aquilino Ribeiro, de sobretudo e chapéu, ficou para mim ligada ao Chiado desses tempos. Visitado o Paris em Lisboa, recheado de maravilhas a metro, descíamos a Garrett pelo passeio contrário já que para cima havia o Largo Camões que já não era Chiado mas sim antecâmara de outros lugares onde não era suposto passearmos. Virávamos então para a terceira rua cujo maior atractivo era a Pastelaria Ferrari onde por vezes aterrávamos para lanchar um batido de morango com chantilly, acompanhado por uma sandwish de carne assada, finíssima e aparada, claro está. Quando o passeio era com a minha mãe e não com as amigas incluía entrar na padaria da Calçada do Sacramento para comprar pão que era suposto ser especial, já que a padaria fornecia a casa de Salazar, e na Casa Pereira para nos abastecermos de café a peso. Passados 50 anos é no Chiado que penso quando me imagino em Lisboa e é por lá que passo quase todos os dias, quando chegam as férias. Também agora qualquer pretexto serve.

2 comentários:

  1. Como me sabe bem recordar o Chiado aqui de longe ... à medida que te lia, vinham-me à memória também os cheiros, dos cafés e dos bolos, das livrarias ...
    conta lá o que é que lias dos livres de poche ?
    ;-)

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  2. Brikerok: O meu primeiro livre de poche foi "Terre des Hommes" do S. Exupéry. Tinha lido o Petit Prince que se tornara logo o meu livro de culto. Senti-me muito crescida por ter um LP (tinha 13 anos). Não sei se o li todo porque o meu francês na época não era ainda muito bom.
    Depois foi em catadupa mas acho que houve uma época em que comprei os livros do Hervé Bazin (a mãe de Vipère au poing impressionou-me muito). A seguir vieram os clássicos franceses do secº XIX, sobretudo.
    mesmo os autores americanos foram lidos na LP. Fiquei com uma relação muito forte com a colecção. Era muito barata e apesar de não ter logo as últimas novidades, para mim chegava muito bem.
    Ainda hoje não sou muito atraída pelas últimas novidades. Adoro reler.

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