25 fevereiro 2009

Jornais

Eles vêm pelo correio, por vezes por mala diplomática. Uma vez por ano viajam de contentor.
Depois de uma primeira vida em Portugal, renascem aqui com nova importância para uma segunda vida nas Oficinas em Língua Portuguesa.
Numa cidade onde, apesar dos três voos da TAP, não há sequer à venda uma revista semanal em português (e há-as em francês!), as Oficinas são regularmente abastecidas graças aos que, em vez de porem os jornais lidos no ecoponto, se dão ao trabalho de os enviar por correio económico.
E têm ainda uma terceira vida pela frente quando são substituídos por outros mais recentes. Fazem então as delícias do Mussa, do Juvenal e de dezenas de outros que depois da diária pergunta “Lavo o carro?” me atiram a seguinte: “Jornais?”
Os sorrisos com que aceitam os renascidos justificam todos os esforços. Naquele dia havia sinais de Carnaval.
Correio para:
Cooperação Portuguesa - PASEG / Apartado 24 / Bissau / Guiné-Bissau

Cinzas

O Carnaval de Bissau já foi e não ficou registado aqui, mas sim aqui.
O desfile passou mas as barraquinhas de quiritim ficarão até às primeiras chuvas porque o investimento foi grande e há que rendibilizar esforço e dinheiro.Lá se beberá o primeiro vinho de caju, quando os frutos amadurecerem.
Mas isso será outra história.

24 fevereiro 2009

Os tachos

Acho-os, desde a minha primeira visita, o maior atractivo do mercado do Bandim. São brilhantes, de formas mil e de todos os tamanhos.
Durante muito tempo sonhei comprar alguns e hesitei na escolha. Depois pensei que eram de certeza um perigo para a saúde, dado o seu aspecto poroso e irregular. Imaginei facilmente mil partículas de metal a soltarem-se para o cozinhado. Depois soube que eram fabricados localmente a partir das latas de refrigerantes e gostei ainda mais deles. Mas as partículas tornaram-se lascas.
Só faltava descobrir um dia que aquele brilho fascinante era devido a uma pintura de tinta prateada!

Continuo a vê-los ao longe, lindos, amontoados, como se de uma escultura se tratasse, a brilhar sob este sol de Bissau, em plena Chapa*.

* A Chapa é o local onde em tempos começava a cidade, assinalado então pelo letreiro correspondente. É o ponto de referência mais utilizado. “Fica antes da Chapa ou depois da Chapa?” Agora já não há chapa.

19 fevereiro 2009

O telheiro

Nos últimos 3 meses uma nova actividade veio juntar-se à longa lista de trabalhos que me ocupam os dias: dona de obra. É difícil construir por estas bandas sobretudo quando se dá valor ao detalhe. Eu bem adiei, durante meses, a revisão dos óculos! Eu bem sabia que a par de um mundo mais brilhante eu ia passar a ver o que não queria e ia ter que pensar. “Pois … ao longe não se nota”. O telheiro ameaçou não chegar a ser, o empreiteiro largou tudo e fugiu para Dakar, as vigas acordaram um dia abauladas, mas tudo se compôs e hoje aqui está ele, quase pronto. Obrigada FNUAP* sobretudo pelo comentário ao meu pedido de desculpas pelo pequeno atraso: “Mas conseguiu! Muitas vezes não se consegue.” Ofereci um grande sorriso de agradecimento. * Fundo das Nações Unidas para a População

17 fevereiro 2009

Bandeiras

O Presidente da Assembleia da República está em Bissau, como o provam as bandeiras dos dois países, hasteadas à porta da Assembleia Nacional Popular. Já passou por mim duas vezes, precedido por batedores com sirenes potentes e luzes a piscar, dignas de um filme de ficção científica. Encostei de imediato e parei, como mandam as regras. Agora já sei. E lá vinham os carros com as bandeirinhas de Portugal a esvoaçar. Terão visto o meu com o logotipo da cooperação portuguesa? O que teria então pensado JG da minha viatura que tanta notoriedade me dá em Bissau?

13 fevereiro 2009

E eles chegaram, pela primeira vez

Após um ano de idas e vindas, de muita reunião cá e lá, de ameaças de vários golpes de estado e de um efectivo, cheguei a Bissau, acompanhando os primeiros professores do PASEG, há 8 anos. A cidade, recém-saída dum conflito, era bem diferente da Bissau em que hoje vivemos. Havia tanques abandonados nas bermas da estrada do aeroporto e muitos edifícios, hoje restaurados, exibiam feridas que pareciam difíceis de sarar. E alguém nos apontou o poilão de triste memória que tão célebre ficara dos telejornais. Esse dia foi de um calor anormal para a época, supostamente mais fresca. E quem já por cá andava há muito sorria, insinuando que, quanto a calor, ainda não tínhamos visto nada. Viria a ser muito pior! As malas eram muitas porque não se sabia bem o que trazer, o aeroporto bem diferente do que é hoje. A espera foi longa e quente e o entusiasmo esmoreceu. Quando chegámos ao Bairro da Cooperação, recém-reabilitado, os professores estavam mudos e suponho que todos mais ou menos se perguntavam se teriam tomado a decisão certa ao decidir viver numa cidade tão diferente daquelas que conheciam. Nos dias seguintes, tudo foi mudando. Eram professores e bastou a primeira aula para os sorrisos surgirem, denunciando a aceitação do desafio enorme que tinham pela frente. Não havia os materiais didácticos sofisticados a que estavam habituados, nem sequer manuais, nas escolas faltavam portas e janelas mas, por outro lado, havia alunos maravilhosos, para quem o professor era uma referência, e colegas prontos a ajudar a todo o momento. Desses 10 professores, ainda cá estão 2. Já ajudaram a integrar os colegas que entretanto foram vindo, a quem contaram a aflição dos primeiros dias, as alegrias e dificuldades dos tempos que se seguiram. Todos juntos fizeram crescer um projecto de que se sentem orgulhosos. Justificadamente! Mais informações sobre o trabalho feito, aqui.

08 fevereiro 2009

Partida!

Estou prestes a partir, não para uma viagem, nem sequer para mais uma voltinha, mas para uma nova aventura. Se levar à letra o que me dizem, parece-me que todos os que conheço nasceram já com um blog criado e com o manual de instruções decorado. Para mim, não vai seguramente ser assim tão fácil e por isso acho que vai ser divertido. Vivo em Bissau há 2 anos e meio mas, de certa maneira, há 9. Tudo começou em 2000, com uma missão de 15 dias. Fiquei agarrada por esta gente e por todo o trabalho que havia para fazer por cá. É assim que começa a história de todos os que ficam por África a trabalhar, eu sei, mas cada um conta a sua "como se fosse única" (lá diz o Chico).